Os (des)sonhos de Pedro
Muitos dias se passaram desde o interrogatório que o Mendes tinha feito com Paulo. Desde aquele dia, Paulo não teve mais nenhum contato com Pedro. Pedro realmente estava desaparecido, como ele disse que faria no dia que partiu.
- Paulo, não poderei mais ficar nesta cidade.
- Mas por que, Pedro? Somos amigos desde o colegial. Se tiver algum problema, podemos revolvê-lo juntos!
- Não esse. Preciso mesmo sair daqui. Vou ficar um bom tempo sem falar com você meu amigo.
Eles conversaram bastante e no final da noite, Pedro partiu. Não disse para onde iria, mas falou que estaria tudo bem futuramente.
Pedro pegou a pista principal e partiu meio sem rumo. A estrada nunca lhe pareceu algo tão difícil de percorrer, mas, naquele momento, parecia estar passando por cima de pedras. Eram seus sentimentos e o que ele estava deixando para trás. Estava se desfazendo de sua vida, mas se consolava ao pensar que estava em busca de algo que realmente mudaria ela.
Ele sempre foi sonhador, mas agora, um de seus melhores sonhos se tornaria realidade. Como diz um filósofo por aí, é bom pararmos de dormir para poder tornar sonhos realidades. Este filósofo talvez tenha dito isso apenas da boca pra fora, talvez nunca tenha entendido com a imensidão que suas palavras proporcionavam. Pedro estava a ponto de conseguir decifrá-las.
Mas nem sempre foi assim. Voltando um pouco no tempo, mais precisamente quando ele tinha 14 anos, naquela mesma árvore com seu melhor amigo, Pedro não teve coragem de acordar.
- Pedro, ela me disse que vai embora, vai mudar de cidade. Você vai deixar acontecer isso sem que você diga para ela que a ama.
- Eu a amo, Paulo, mas não posso dizer isso pra ela. Como você sabe que ela vai embora?
- Ela me disse. Ela nunca tinha conversado comigo antes, mas me pediu para dizer isso pra você.
- E o que você disse pra ela?
- Disse que falaria com você.
- Mas do que adianta eu falar para ela que gosto dela, se agora ela vai embora?
- Não dê essa desculpa, cara. Não deixe ela partir sem saber o que você sente por ela. Isso não é justo com ela, não é justo com você.
- Não é justo? E o que é justo? É eu falar para ela que a amo? E daí, ela vai embora, e se ela começar a gostar de mim, vai sofrer pela distância? Isso é justo?
- Cara, desisto, não dá pra falar com você sobre isso.
No dia que partiria, Fernanda se despediu de todo mundo da sala. Era perceptível que ela estava muito triste, não queria partir assim, desta forma, com dúvidas sobre seu presente e futuro. Pedro a observava de longe, não tinha coragem de falar nada com ela, também estava triste.
- Pedro, você não vai me abraçar? - Perguntou Fernanda, intimidatória.
Pedro ficou vermelho, mas a abraçou. Não foi um simples abraço de colegas. Foi um abraço importante para os dois, daqueles que demoram, que para o tempo, que faz os pensamentos se perderem no ar, que dá vontade de que dure para sempre. Era um abraço apertado, em que os dois se perdiam nos braços do outro. Todo mundo percebeu, mas ninguém disse nada. Paulo viu a cena calado, ele esperava que esse era o momento que Pedro se declararia: "Vamos Pedro, diga o que você sente por ela, não há motivos para não dizer, dá pra ver que ela sente algo por você, vamos meu amigo!". Paulo pensava firmemente nisso quando o abraço acabou. Fernanda também estava vermelha e com os olhos carregados de lágrimas.
- Você não tem nada a me dizer?
- É... boa viagem, Fernanda. Que você encontre bons colegas lá também, rsrs.
- Só isso? Você não tem mais nada pra dizer? Mesmo?
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Paulo acompanhou Fernanda até a saída, onde um carro a esperava para levar pra casa.
- Por que ele não me disse, Paulo? Por quê?
- Não sei, Fernanda, eu pensei que ele diria...
- Eu gosto dele, mas se ele não tem coragem de admitir o que sente, não posso fazer nada.
Fernanda entrou no carro, mas antes, entregou um papel que continha seu novo endereço. Fernanda era meiga, gostava de escrever, mas não era muito de falar. Não era tímida, mas era quieta, ficava no seu canto com suas amigas. Um dia, ela machucou o punho esquerdo jogando vôlei. Foi levada para a cozinha, onde uma cozinheira passava gelo no lugar. Não era nada grave e a dor já estava passando. Ela reparou pela porta que Pedro passava de um lado para o outro, então deu um sorriso para ele e ele desapareceu. Ela gostava dele, mas nunca conversaram até aquele dia. No recreio, milagrosamente, ele veio falar com ela.
- Você está bem?
- Estou sim, Pedro, a dor já passou. Você ficou preocupado?
- Um pouquinho, mas que bom que você já está bem.
No dia seguinte, na aula de educação física, os dois ficaram juntos jogando ping-pong. Se olharam bastante, mas o que os olhos diziam diferia dos que as bocas falavam. Os olhos dos dois se encontravam, mas logo se desviavam e as bocas apenas contavam os pontos.
Desde aquele dia, Fernanda pensava nele, mas agora ela estava partindo e deixando para trás tudo o que não houve. Amor calado, essa era a definição para o que houve entre os dois. Pedro se arrependeu profundamente de nunca ter dito o que sentia pra ela, por isso nunca mais falou sobre o assunto.
Pedro realmente era muito tímido, e continua tímido até hoje. Mas isso não importaria mais, ele mudaria completamente sua vida quando chegasse na cidade para onde estava indo.
Continua...
Capítulo um - Capítulo dois - Capítulo três - Capítulo quatro - Capítulo cinco - Capítulo seis - Capítulo sete - Capítulo avulso - Capítulo oito - Capítulo nove - Capítulo dez (final)
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