março 2017 | Blog do Joanir -->

Meu último cookie

terça-feira, 28 de março de 2017
Eu tinha morrido, minha alma estava ao lado do meu caixão. Meu corpo, ali dentro daquela urna, sorria, mas eu gritava por dentro. Minha tristeza era saber que eu não pertencia mais àquele mundo, e nem ao meu próprio velório.

Uma floresta densa com alguns raios de sol adentrando-a e um cookie ao centro
Meu último cookie

Todo mundo de preto. Clichê. Uns violinos ao fundo me faziam lembrar quando o Titanic estava afundando. Não, eu não estava lá quando o navio afundou, mas vi no filme. Mentira, nem vi o filme ainda, me contaram.

Estavam servindo refri pros convidados, uns riam, outros choravam, alguns contavam casos. Já eu... Eu continuava ali no meu canto. Falando em canto, eu não canto. Às vezes, só pra eu mesma me ouvir. Mas que jeito solitário de cantar. Eu realmente estava filosofando sobre o canto que não canto, que doideira.

- Venha comigo e te mostrarei as partes mais felizes de seu passado! - Disse um carinha estranho.
- É o quê? - Perguntei-me. Fiquei chateada porque interromperam meus pensamentos, mas feliz, porque alguém me notou aqui sozinha.

Fui com ele. É, sou mesmo doida. Mas, ficar ali também não estava legal. Não me lembrava o nome daquele ser que me falara aquilo. Porém, aos poucos eu ia chegando a conclusão de que ele seria a morte. Veja bem: surgiu do nada, veio falar logo comigo, vai me fazer lembrar de coisas do passado... Isso casa bem com a teoria de que passa um flashback de toda nossa vida no momento em que estamos partindo pra lá (depois da morte).

E então eu voltei no tempo com ele. A princípio, eu estava com medo, pois estava viajando com a morte. Mas, paradoxalmente, a morte estava me mostrando a vida. Vi como eu era, as coisas que aconteciam comigo, a minha natação, os professores antigos, vi tanta coisa.

Vi e participei dessas lembranças. Chegamos, enfim, na festa de aniversário do meu avô. Estava todo mundo na chácara da minha tia, ou seja, meus primos e primas, tios, tias, minha irmã, meus pais e meus avôs. Muita gente pra eu lembrar o  nome de todos.

A morte me avisou que essa seria a última lembrança, mesmo eu nunca tendo vivido isso, então me deixou conversar com as pessoas da festa. Peguei uma bandeja pra servir cookies para as pessoas (e também para comer, já que sou esperta). Servi para meu avô, ele ficou muito contente, me deu um abraço tão apertado que parecia saber que eu não estaria mais ali no dia seguinte.

Conversei com minhas primas sobre coisas contemporâneas, mas elas não entenderam muito. Enfim, consegui falar um pouco com todo mundo. Não me lembro a música que estava sendo ouvida ali, mas sei que não eram meus k-pops preferidos (pareciam mais os flashbacks de um amigo meu).

Eu estava feliz. Até a morte atacava os salgadinhos na outra sala. Eu tentava me lembrar desse acontecimento, mas eu nunca tinha vivido isso antes. A morte percebeu que eu estava pensativa, mas não conseguiu me falar nada, pois um barulho estranho veio lá de fora da casa.

Os cachorros começaram a latir para lugar nenhum. As luzes piscaram descompassadamente. Um vento forte rompia os vidros das janelas e saia pelo outro lado das portas. Ficamos todos com medo.
- O que é isso, morte?
- Esse é o fim, Mii! O fim.

Um vento forte derrubou meu último cookie no chão. Fiquei muito triste com aquilo, mas me esqueci do medo. A morte me olhou serenamente. Disse que eu ficaria bem depois de tudo aquilo. Eu não entendia, pois não sabia o que poderia vir depois da morte. Tudo ficou muito claro, e eu...

Acordei.