A mulher que não falava - capítulo cinco | Blog do Joanir -->

A mulher que não falava - capítulo cinco

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2014
A vida dela

Ela era virtual. A mulher que Pedro depositava sua felicidade não passava de um programa de computador, mas ele cria que isso iria mudar. Toda a energia que ele armazenou seria capaz de criar um campo eletromagnético entre o seu computador e ele, fazendo com que um portal se abra no mundo real e no mundo virtual que ele criou. Isso ainda não passava de uma teoria, mas se tornaria real com o equipamento que ele estava arrumando.
A ideia de construir um mundo virtual já fazia parte dos pensamentos dele há muito tempo. No início, ele queria apenas criar um jogo, mas ao descobrir que poderia fazer muito mais que isso, se afundou nos livros de linguagens tecnológicas e programas de renderização virtual. Após criar sua primeira biosfera virtual, ele se empenhou para que todos os objetos respondessem à ação do tempo, ou seja, que o tempo exercesse forças às matérias e estas ficassem velhas ou gastas, que as plantas crescessem e envelhecessem. Pedro conseguiu criar um ciclo independente da vida. O seu mundo não era mais controlado por ele, era vivo.
Imagem: http://www.pascomcampinas.org.br
Mas faltava algo nesse mundo e no mundo real de Pedro. Ele se sentia só. Não todo o tempo. Passava a tarde com Paulo e seus amigos de trabalho, mas à noite, na hora de dormir, ele percebia o quanto estava só e como desejaria ter alguém ali, só para ele ver esse alguém fechar os olhos e dormir. 
Todo mundo se sente ou já se sentiu só, mesmo aquelas pessoas que estavam com o parceiro ao lado. Pedro sabia disso a partir de suas observâncias, mas não se contentava. Ele queria alguém, mas não tinha coragem. Não no mundo real.
Numa noite, em que estava com insônia, ligou o seu notebook para visitar seu mundo e teve uma ideia brilhante. Criaria uma mulher, assim, poderia treinar com ela e depois aplicar o que aprendesse com uma mulher de verdade. A ideia parecia interessante e talvez funcionasse. Passou três dias trabalhando nela e quando acabou, a chamou de Fer. Não foi por querer que esse nome surgiu, apenas surgiu. Poderia ter ligação com a Fernanda da sua infância, mas ele não reconhecia tal ligação.
Fer era linda. Isso todo mundo diria, mas para Pedro, ela não era só linda, era magnifica. Ele criou tudo para ela: uma casa, montanhas ao redor, um rio corrente, um mar e a cada dia, ela estava mais feliz. O que ele percebeu é que toda a meiguice dela estava conquistando o seu coração. Foi daquele tipo de amor que surge aos poucos e sem querer. Ele não conseguia ficar um dia sem vê-la, ela parecia tão real.
Mas ela não era real, Pedro tentava se convencer disso todo dia. Porém, já era tarde de mais. Ele estava viciado nela.
Toda alegria que Fer exalava nos primeiros meses foram se esgotando. Ela sentia tudo ao seu redor, mas parecia que as coisas estavam perdendo vida. Parecia que ela estava morrendo aos poucos. De alguma forma, ela sabia que alguém fazia tudo aquilo para ela, mas não sabia quem. Tinha muitas dúvidas. Algumas perguntas se faziam dentro de si como: "quem eu sou?", "por que estou aqui?", "quem é esse que sinto, mas não vejo?"
Ela não o via, mas acreditava nele. Era o único contato que ela tinha com alguém, mesmo não sabendo quem era. Ela queria sair da situação em que estava, queria saber mais.
Talvez essa angústia dela tenha feito Pedro ter a ideia de libertá-la.

Continua...